Artista | Zico Farina | @zico_farina

Zico Farina iniciou seu trabalho pela fotografia. Atualmente incorpora serigrafia, colagem, caligrafia e gifs. Vive em São Paulo.

QUANDONÃOHOUVERPALAVRA/QNHP

"Hoje eu atingi o reino das imagens, o reino da despalavra" Manoel de Barros, Ensaios Fotográficos, 2000, Ed. Record

Contexto/Conceito

Quando Não HouverPalavra é um projeto/pensamento/obra que traz para diferentes superfícies uma

questão do nosso tempo: o esvaziamento da palavra.

Palavras usadas, repetidas à exaustão, apropriadas, tagueadas, algoritmizadas pelas redes sociais, foram

esvaziadas de significados.

A repetição esvaziou o âmbito de comunicar ou de trazer entendimento. Trouxe justamente o oposto. Ao esvaziar, cercou-se de narrativas e linguagens que visam somente à confusão como forma de poder, influência e manipulação. Um caos organizado, programado, medido, alternado em tempo real para entregar o que querem e gerar F.O.M.O.

O esvaziamento da palavra não se faz pela sua exclusão, mas pela sua multiplicação algoritmica. É pela escala, pela abundância, pela oferta excessiva que ela perde seu valor. Uma lógica capitalista e neoliberal. de mercado, onde a produção em massa faz o preço baixar e ser acessível como mercadoria a um número maior de pessoas. O resultado disso, entre outros, é a poluição, a névoa mental, a ansiedade, a exaustão, o esgotamento que aqui não é apenas do planeta e de seus recursos, mas das palavras. E, sobretudo, das pessoas.

Paradoxo da Escrita

São Paulo é uma cidade escrita.

A escrita é a forma humana de registro. Usa-se o símbolo da letra e da palavra como uma representação gráfica do pensamento. A letra/palavra é a construção gráfica da palavra oral e do pensamento - seja do pensamento pragmático que ilustra o real ou do pensamento criativo que ilustra o irreal, o imaginário, a ficção. A cidade de São Paulo assim como outras metrópoles, ou mesmo cidades menores - tem, em suas vias, ruas, calçadas, paredes, muros e fachadas, um alfabeto.

São Paulo é uma cidade escrita, descrita pelo pixo, pelo grafite, pelos lambe-lambes, pela publicidade onipresente em telas, displays e luminoso5.

O alfabeto de São Paulo varia conforme a região. Dos recantos higienizados e gentrificados da classe média e alta, aos ambientes degradados, cheios de vida e lixo das classes marginalizadas, a cidade se escreve. E se auto-descreve.

Basta olhar pela janela do ônibus que cruza os corredores de leste a oeste, de norte a sul da capital. A cidade se apresenta: pixos, tags, adesivos, inscrições - uma protuberância de letras, riscos, rabiscos, imagens, símbolos que representam uma identidade local e também universal.

É como se a caverna de Blombos, na África do Sul, onde se encontram os registros mais antigos da humanidade, saltasse pelos olhos em dezenas de quilômetros de paredes, postes e muros, na sua versão urbana. Essas manifestações são, antes de tudo, registros humanos. Registros de existências, de pessoas. Cada um carrega uma história mesmo que ela seja sumarizada em um risco feito com tinta ou uma imagem indecifrável com spray. A humanidade se faz descrita nesses gestos de resistência. E de existência.


A Caligrafia da Não-Escrita

A obra Quando Não Houver Palavra usa da idiossincrasia e de uma fina ironia para trazer a discussão do esvaziamento da palavra. Ela criou uma não-caligrafia, ou escreve um não-texto.

A imagem que surge nas telas gigantes é um contraponto às telas pequenas e azuis dos celulares. A não-escrita sobrepõe uma série de não-textos, que viram uma não-letra de uma não-língua.

O resultado são várias camadas sobrepostas de textos/imagens/símbolos que se atropelam, se danificam, se confundem, se unem, se fundem, se abstraem, formando imagens que mudam de significado ao se aproximar e ao se afastar. Instintivamente, procura-se um significado, uma leitura convencional, uma palavra perdida, decifrada mas nada ali é o que parece ser.

Mais do que flertar com o Modernismo Brasileiro de Mira Schendel ou o Abstracionismo Americano de Joan Mitchell e Cy Twombly, a obra Quando Não Houver Palavra é um tributo àqueles que já escreveram essas palavras por imagens, gestos e obras. Seres invisíveis que se tornaram visíveis aos olhos de quem passa e os vê.

Porque as galerias, os museus e as academias não são para todos. Mas todos existem.

E, com sua grafia suja e violenta, se fazem existir.

É deles o mundo que o mundo não quer ver.

É deles a palavra.

Zico Farina
QuandoNãoHouverPalavra, 2025
Acrílica, Serigrafia e Giz de Cera sobre tela de lona
90 x 150 cm

Zico Farina
QuandoNãoHouverPalavra, 2025
Acrílica, Serigrafia e Giz de Cera sobre tela de lona
90 x 150 cm

Zico Farina
QuandoNãoHouverPalavra, 2025
Acrílica, Serigrafia e Giz de Cera sobre tela de lona
90 x 150 cm

De 28 de agosto a 20 de setembro de 2025

De 28 de agosto a 20 de setembro de 2025
Espaço República
Rua São Luiz, 86 | 5o andar
São Paulo - SP

Visitação
Quinta a domingo, das 13h às 18h
Entrada gratuita

Abertura
28 de agosto | 17h às 21h